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terça-feira, 10 de novembro de 2009

O pai dos pobres e a Lei de Contravenções Penais

Todos aqueles que são espectadores assíduos do programa CQC, da Rede Bandeirantes, devem ter assistido ao episódio de ontem, do dia 9 de novembro. Aqueles que não assistiram, situar-los-ei: uma das matérias protagonizada pelo repórter Danilo Gentili foi sobre uma lei "ressuscitada" pela cidade de Assis, em SP, sobre pessoas que dedicam-se, nas ruas, ao secular hábito do ócio. A notícia acabou sendo não só do CQC como de vários outros veículos jornalísticos do país.

Manchete no jornal local sobre a lei, intitulada "Tolerância Zero" (clique na imagem para vê-la maior)

Vamos por partes: a lei a que me refiro é o artigo nº 59 do capítulo VII da Lei de Contravenções Penais do Brasil, instituída no país em 1941 pelo Excelentíssimo Sr. Getúlio Vargas, então presidente da nação. Em suma, é uma lista de todas as ações consideradas indevidas, infratoras ou contrárias à lei brasileira. Acontece que a Constituição que usamos é de 1988, e entre as duas existe uma série de contradições que tornam muitas dessas Contravenções totalmente incabíveis - como é o caso da que falamos.

Transcrevo-a aqui:

Art. 59 - Entregar-se alguém habitualmente à ociosidade, sendo válido para o trabalho, sem ter renda que lhe assegure meios bastantes de subsistência, ou prover a própria subsistência mediante ocupação ilícita:

Pena - prisão simples, de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses.

Parágrafo único - A aquisição superveniente de renda, que assegure ao condenado meios bastantes de subsistência, extingue a pena.


Trocando em miúdos, a lei diz que qualquer pessoa em condições de trabalho que for pega nas ruas fazendo absolutamente nada será detida, em pena de 15 dias a 3 meses. Aqueles que obtêm dinheiro de formas ilícitas (como, por exemplo, jogos de azar) também estão enquadrados. Note que o artigo nada fala sobre "15 dias de aviso prévio ao infrator", como foi dito pelo delegado da seção onde Gentili foi autuado.

Esta lei, datada de 1941, nada mais era, na época, uma forma de Getúlio Vargas garantir ao país mão de obra suficiente para o desenvolvimento industrial da nação, e ainda de quebra impedir que os chamados "vagabundos" ficassem pelas ruas, cometendo possíveis delitos.

Se esse parágrafo já te pareceu absurdo mesmo naquela época, imagine agora. Depois de 20 anos de ditadura, o brasileiro abomina, tem trauma, de qualquer tipo de limitação de um dos mais básicos Direitos Humanos, garantido por leis internacionais: a do livre arbítrio. É dito, claramente, que toda pessoa tem o direito à liberdade, ou seja, o direito de ir e vir, de qualquer lugar a qualquer lugar, na hora em que bem entender. O fato de um mendigo beber deitado em uma praça não fere nenhum outro artigo da Constituição. E a Constituição é Stephanny absoluta.

Fora que isso é bem uma hipocrisia. "Qualquer pessoa apta a trabalhar". Mas apta em que sentido? Fisicamente? O mundo evoluiu, a tecnologia avançou, o mercado de trabalho absorveu as máquinas e descartou mão-de-obra não-especializada. Como o governo espera que pessoas sem instrução consigam um emprego num estalo de dedos? Se em vez de correr atrás de cidadãos desfavorecidos pela sociedade a polícia se ocupasse com verdadeiros criminosos, e o poder público se preocupasse em gerar emprego e renda a essas pessoas, aí sim teríamos uma queda na criminalidade. Não só lá em Assis, cidade de São Paulo, mais rico e bem desenvolvido estado do Brasil. Não só lá no sudeste, onde tudo é lindo, maravilhoso, avançado e civilizado. Mas também aqui, no norte, onde mato e assassinatos à pexeira são aspectos cotidianos das tribos cidades. Também aqui no Pará, onde a falta de preocupação com a saúde pública nos leva a um surto de doença de Chagas em pleno século XXI - e o IDH descendo...

E pra finalizar, vejam que interessante isso que eu achei no Código de Direito Penal brasileiro, capítulo VI ("Da Liberdade Provisóra, com ou sem Fiança"), artigo 323:

Artigo 323 - Não será concedida fiança:
(...)
II - nas contravenções tipificadas nos arts. 59 e 60 da Lei das Contravenções Penais
(...)


O que até faz certo sentido, se não uma redundância, já que um "vadio" não teria dinheiro algum pra pagar a fiança... Ah, e a saber:

Art. 60 - Mendigar, por ociosidade ou cupidez:

Pena - prisão simples, de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses.

Parágrafo único - Aumenta-se a pena de um sexto a um terço, se a contravenção é praticada:

a) de modo vexatório, ameaçador ou fraudulento;

b) mediante simulação de moléstia ou deformidade;

c) em companhia de alienado ou de menor de 18 (dezoito) anos.


Pois é. E dá-lhe nos mendigos. Vai que essa moda pega? O pessoal da praça da República que se cuide!

Procurando bem, até que essa LCP tem umas coisinhas legais. O artigo 65º, por exemplo, é bem útil. Dava pra ter enquadrado minha irmã nele umas trocentas vezes.

Esperando não ter esquecido nada, despeço-me. E perdoem-me se minha abordagem de ideias tiver ficado um pouco confusa. É uma hora da manhã, muita informação pra dissertar. Coesão vai pro espaço.

Abraço, e até a próxima!

Perturbação da tranqüilidade

Art. 65 - Molestar alguém ou perturbar-lhe a tranqüilidade, por acinte ou por motivo reprovável:

Pena - prisão simples, de 15 (quinze) dias a 2 (dois) meses, ou multa.

sábado, 10 de outubro de 2009

Um estalo e meu muito obrigado!

Pode parecer bem corriqueiro, mas é importante pra mim. Este post é especialmente dedicado à minha família e a todos os meus amigos. É dedicado a eles porquê sei o quanto são importantes... Não, indispensáveis, na minha vida. É muito fácil se rodear de pessoas nas festas e horas felizes, mas só os seus verdadeiros companheiros permanecerão quando vier a estiagem, as horas tristes.

Seja emprestando livros, me oferecendo palavras de sabedoria e carinho, deixando recados e depoimentos no Orkut, vocês todos me fazem alguém muito feliz, e muito mais completo do que me julgo ser. Peço que contem sempre comigo, pois estejam certos de que ajudarei-os quando mais precisarem - assim como fazem comigo nesse momento.

Nomes não foram citados de propósito. Aqueles a quem estou me referindo sabem que o são. E não pensem que este post contradiza o que fiz antes, a respeito das relações humanas. Certamente que continuarei a procurar a "outra metade" - mas com a certeza de que todos esses estarão ao meu lado, e que não devo me sentir só ou infeliz enquanto não a encontro.

A todos vocês, meu muito obrigado. Amo todos vocês!

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

MPN 2009 e o bom gosto do público jovem brasileiro

Só música e críticas sociais por aqui; tá na hora de descontrair um pouco. Então resolvi falar sobre um eventozinho que pouca gente sem TV por assinatura conhece: os Meus Prêmios Nick 2009.



Basicamente uma versão nacional do Kid's Choice Awards, um evento promovido pelo canal de TV fechada Nickelodeon nos EUA, os Meus Prêmios Nick premiam pessoas, brasileiras ou não, que se... destacaram em diferentes categorias escolhidas pelos organizadores. Os indicados são votados por quem não tem o que fazer quiser, no site da Nick, via celular, etc.

A edição desse ano contou com um monte de bandas podres algumas bandas brasileiras, uma italiana e uma venezuelana. Entre elas, o Skank.


Skank tocando "Ainda Gosto Dela". Legal, mas eles têm melhores...

Algumas das categorias tinham vencedores premeditados, pela obviedade do gosto do público jovem que participa dessas coisas. Por exemplo, a categoria Filme do Ano teve como indicados:

Crepúsculo
High School Musical 3: Ano da Formatura
Se Eu Fosse Você 2
Harry Potter e o Enigma do Principe

Algum chute do ganhador? Claro que só podia ser Crepúsculo. O prêmio (um troféu laranja em forma de dirigível com o logo da Nickelodeon chamado Zeppy, analogia ao Zeppelin) foi entregue a Edward Cullen, o porfírico, que (claro) não pôde comparecer ao evento. Ele apenas gravou um tape pra ser exibido na premiação agradecendo o balão.

Olha a cara de tédio do cara ao receber um prêmio a qual ele nem sabia que estava concorrendo

Depoimento dele com o Zeppy na mão: "Olá, Brasil! Eu, Edward Cullen, agradeço em nome de todo o elenco do Crepúsculo por esse maravilhoso *tosse* prêmio que recebemos. Infelizmente não podemos estar aí pra sentir essa magia, toda essa energia que vem de vocês - mas é que a gente tem coisa melhor pra fazer"

Uma das únicas categorias justas foi a de humorista. Marcelo Adnet ganhou - dava pra ser diferente?

Aliás, o Oscar Filho (Pequeno Pônei) concorreu nessa categoria. Ele apresentou uma outra, ao lado da Stefhanny (aquela do CrossFox, do YouTube, lembram?). O CQC concorreu na categoria Programa de TV Favorito, ao lado de Hannah Montana, Pânico e Isa TKM. Por mais absurdo que pareça, a maioria dos 23 milhões de desocupados votantes escolheu pelo programa Pânico. Sinceramente, não vejo qualidade naquilo. Só no MPN pra eles ganharem do CQC mesmo.

Uma das pérolas da noite ficou a cargo de Cláudia Leite, vencedora da categoria Cantor ou Cantora do Ano. Como ela também tinha coisa melhor pra fazer, não compareceu à premiação; apenas recebeu o prêmio. Em vídeo gravado para exibir no programa, ela demonstrou toda a sua falsidade euforia em ganhar um prêmio dessa magnitude ao declarar: "Obrigada, galera da Níquelôdeôm!". Nada contra os [cariocas com alma de] baianos, visse?

Depois de ver o CQC perdendo pro programinha barato da RedeTV!, nada mais me surpreendeu. Nem mesmo o Skank perdendo na categoria Banda Favorita para o NX Zero. Era de se esperar, não?


Show da banda Cine. Rafael Cortéz: "São aqueles meio viadinhos?"

O mais incrível foi a - com o perdão da expressão chula - pagação de pau pro Bob Esponja. Fizeram filminho de homenagem e tudo. É que esse ano ele faz 10 anos. Foi em 1999 que essa esponjinha estranha, que adora contrariar as leis de tudo quanto é ciência, apareceu pela primeira vez na TV. Parece que foi ontem, não?

Agora, adivinhem em que categorias o porífero ganhou. Sim, a de Desenho Animado Favorito é o óbvio. Mas duvido que acertem a outra. Ó, vou dar uma dica:



...Não ajudou muito, né? Ok, eu digo. É a categoria Personalidade do Ano, onde Bob e Obama concorreram juntos. Obama ganhou, mas a secretaria meia-boca da Nick do Brasil não conseguiu falar nem com o faxineiro da Casa Branca É claro que o nosso queridíssimo invertebrado ganhou, de lavada!

Por último, e não menos importante, tivemos um mané o Lucas, da banda Frescno, tomando um banho de Slime - uma gosma verde que eles dizem ter uma receita super-secreta, quem sabe de alcachofra com babosa, hiper nutritiva pra pele e pro cabelo.


AAAHH, lá se vai minha chapinha! ><'

Mas cá pra nós, é só Amoeba.



E diluída em água, que é pra render mais.

Até a próxima!

terça-feira, 1 de setembro de 2009

O resfriamento das relações e a racionalização do amor

Bonito título, não? Parece até tema de dissertação de mestrado. Mas não é. É apenas uma reflexão de alguém que já está cansado de ver isso acontecer.

Algumas vezes na vida ouvi que entregar-se de corpo e alma a um amor, dedicar-se integralmente a ele, é pura besteira; ocupa nosso tempo, nos faz jogar nossa vida fora e não traz benefício algum no fim das contas. De fato; muitas vezes, o relacionamento não dá certo, e acabamos com a sensação de que aqueles momentos que separamos exclusivamente para ele foram em vão. Não devemos, então, nos prender a uma pessoa, e sim sermos livres para ir e fazer o que nos der na telha; afinal, em nada contribuirá para a nossa formação aqueles períodos "inúteis" de nossa vida, não é mesmo?

Ora, mesmo que isso seja verdade, é um conhecimento que não se pode passar de geração para geração. É um conhecimento que deve ser apreendido do convívio, das situações pelo qual passamos ao decorrer dos nossos dias. Não é questão de "cometer os mesmos erros dos meus pais", ou coisa parecida. É questão de ser... um ciclo! Todos nascemos, crescemos, nos relacionamos, nos reproduzimos, envelhecemos e morremos. O que move o homem não são as respostas; são as perguntas. É a sua curiosidade de conhecer, de aprender, de vivenciar. Como pode, então, um adolescente de 17, 18 anos dizer que "já viu tudo, não tem nada mais para aprender, já é maduro o suficiente para dizer, com toda a certeza, que amar é uma bobagem. Que se relacionar não traz benefícios; é puro desejo, é puro capricho de nossos corações."? Isso não existe. É pura soberba, é puro egoísmo, pura vaidade.

O amor não é uma substância que compramos em farmácia e tomamos. Amor não é, tampouco, uma flechinha que nos é atirada por um anjo de fraldas. É um sentimento, e quando eu digo sentimento, quero dizer que não faz parte da racionalidade. Dizem que o amor é cego, mudo e surdo exatamente por isso; ele vai contra todos os dogmas, todos os preconceitos, todas as implicações que um olhar científico imprime. "Amor é pra sentir, não pra entender", já dizia o poeta. Se racionalizarmos o amor, não teremos filhos com aqueles pelo qual realmente temos apreço, e sim com aqueles que nos pareçam mais "aptos a sobreviver", ou que nos pareça "a decisão mais lógica", etc.

Mas mais soberba e vaidade ainda é achar que podemos ser felizes sozinhos. O ser humano não é assim. Essa não é a nossa natureza. Desde pequenos, precisamos de figuras próximas de nós para tudo; seja para nos alimentar, nos dar apoio emocional, educativo, psicológico, compartilhar e discutir ideias e opiniões. Esse papel é feito pela nossa família e pelos nossos amigos. Mas há sempre aqueles com quem nos identificamos mais, que são mais próximos de nós; a esses, chamamos de melhores amigos, pois são eles que estão do nosso lado, entendem como nos sentimos e dão ótimos conselhos para as dificuldades que enfrentamos na vida. E no meio desse grupo, há sempre um que nos cativa mais que os outros. Seja por ele ser mais verdadeiro, ou mais carinhoso, ou mais atencioso, ou mais inteligente, ou mais - por que não? - bonito. Para com esse temos um sentimento ainda mais profundo, criaremos uma relação ainda mais estreita. A isso damos o nome de amor. E é esse valor que está se perdendo hoje em dia, seja pela incredulidade de nossa geração ou mesmo pela falta de interesse nele. O que "tá na onda" hoje em dia é "ficar" - namorar é super careta, bicho.

E isso nos traz à reflexão: o que leva uma pessoa a ter essa visão de mundo? O que leva uma pessoa a não acreditar no amor, ou julgá-lo não essencial para a plena felicidade de si ou de outrem? Uma decepção amorosa muito forte, talvez? Medo de não gostar - ou até mesmo de gostar e sentir-se fraca, impotente diante daquele sentimento que a controla, e não o contrário? São todas divagações que podemos fazer. Mas uma coisa é certa: enquanto essa pessoa não abrir a mente, enquanto ela permanecer sempre no seu mesmo mundinho enclausurado, egoísta e boçal, e enquanto achar que o resto do planeta gira em torno de si e de suas ideias (que, por sinal, julga serem absolutas), ela jamais sentir-se-á satisfeita, feliz e completa.

E tenho dito.

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Dire Straits e o bicampeonato de melhor banda inglesa (!)

Atendendo a pedidos do meu queridíssimo amigo Pedro (e por amar a banda também), venho aqui postar um álbum da banda Dire Straits, cujo vocalista, Mark Knopfler, está ali do lado, ó, na minha imagem de exibição ->

Eu realmente não estou com vontade de postar os 6 álbuns da carreira deles, então vou postar uma coletânea que reúne as melhores músicas dos camaradas.

Eu tenho esse DVD, háá!

Formada em 1977 por Mark Knopfler (guitarrista e vocalista), seu irmão mais novo, David Knopfler (guitarra e vocais), John Illsley (baixo e vocais) e Pick Withers (bateria e percussão), a banda recebeu esse nome (numa tradução livre, "em farrapos", ou qualquer coisa sinônima de "estar na bancarrota") por causa da péssima situação financeira dos membros na época. Apesar de ter nascido quando a onda pop e o movimento punk rock (o qual, segundo Dado Dolabella, João Gordo traiu) estavam em ascensão, eles tocam um rock mais setentista - o estilo que todos preferem, é claro.

Tudo começou com uma fita demo que eles levaram para o DJ Charlie Gillett, que tinha um show chamado "Honky Tonk" na Rádio BBC de Londres. A banda só queria conselhos, mas Charlie gostou tanto da música deles que tocou Sultans of Swing (que viria a ser, mais tarde, seu maior hit) no seu show. Dois meses depois, Dire Straits assinou um contrato com a gravadora Phonogram Records.

Sultans of Swing: The Very Best of Dire Straits, lançado em agosto de 1998 (relançado com DVD em 2002), reúne os 16 maiores sucessos de seus 6 álbuns. São eles:

Sultans of Swing, do álbum Dire Straits, de 1978
Lady Writer, do álbum Communiqué, de 1979
Romeo and Juliet, do álbum Making Movies, de 1980
Tunnel of Love, idem
Private Investigations, do álbum Love Over Gold, de 1982
Twisting by the Pool, do EP ExtendedancEPlay, de 1983
Love over Gold, do álbum ao vivo Alchemy: Dire Straits Live, de 1984
So Far Away, do álbum Brothers in Arms, de 1985
Money for Nothing, idem
Brothers in Arms, idem
Walk of Life, idem
Calling Elvis, do álbum On Every Street, de 1991
Heavy Fuel, idem
On Every Street, idem
Your Latest Trick, do álbum ao vivo On The Night, de 1993
Local Hero/Wild Theme, idem

Sendo os coloridos os destaques.

Indiscutivelmente o maior hit da banda, Sultans of Swing possui um estilo que (me enoja dizer isso, mas...) lembra o brega paraense. De fato, o estilo é precursor das porcarias que temos hoje, mas naquela época as coisas eram bem mais trabalhadas. As guitarradas são o forte da banda, e o ritmo marcado pela percussão também é muito bacana. Dançante até.

Mais ou menos no mesmo estilo da anterior, Lady Writer tem uma guitarra bem executada e uns vocais interessantes.

Considerada pelos críticos uma das melhores músicas deles, Romeu and Juliet é mais romântica, como o nome sugere. A guitarra é mais comportada e o ritmo, apesar de um pouco triste, é bastante legal.

Com uma introdução que mais parece daqueles desenhos antigos, que cresce com um teclado e uma guitarra cativantes, Tunnel of Love tem arranjos maravilhosos e um ritmo indiscutivelmente digno de destaque. Pick Withers se superou aqui.

Introdução legal também, So Far Away tem um ritmo pacato e energizante ao mesmo tempo.

Money for Nothing talvez seja uma das mais conhecidas deles, e tem um clipe bem estranhinho. O ritmo é bem legal, marcado com bateria e guitarras bem executadas. Saca só o refrão da música: "É assim que se faz; dinheiro pra nada e putas de graça". Fala da MTV também. Vai ver foi a empolgação de finalmente não ser mais "Dire Straits" de fato.

Super divertida e cativante, Walk of Life é, pra mim, uma das melhores músicas da banda. Ritmo dançante, com guitarras, baixo, bateria e vocais muito bem harmonizados. Quem vê o vídeo da música percebe a felicidade dos membros ao tocá-la. É contagiante.

Heavy Fuel conta com uma introdução mais "bad boy", e tem um ritmo idem. É, eu sou mesmo péssimo em descrever músicas, mas garanto: essa é legal. Só ouvindo pra saber.

Sem dúvida a obra-prima da banda, Your Latest Trick tem uma percussão show de bola e um solo de sax perfeito. Além do ritmo super envolvente, das guitarras bem colocadas, do trabalho maravilhoso do saxofonista Chris White e do teclado excepcional, a música conta ainda com o instrumento predileto do Ben Harper: a Pad Guitar! Do início ao fim, maestral em sua composição.

As outras, apesar de eu não ter dado destaque, são também muito boas. Twisting by the Pool, por exemplo é puro... twist! E Local Hero/Wild Theme é um solo de guitarra maravilhoso performado por Mark Knopfler.

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Escutem, e, se puderem, comprem o DVD. É muito bom, vale MESMO a pena! Só pra terem uma ideia do quanto os caras são bons, eles ganharam o prêmio de melhor banda inglesa DUAS vezes: em 1983 e em 1986. Eu disse INGLESA. Não é pra qualquer um não. Nem o Jethro, né, Pedro?

Até!

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Freedom Call e o folk brasileiro

Essa foi rápida, hein? Arrumei um tempinho livre e vim aqui postar mais um álbum da minha banda favorita.


Freedom Call, EP lançado em 1996

Segundo EP (Extended Play; não é grande o suficiente para ser considerado álbum, nem curto o bastante para ser considerado single) da banda, lançado em 1996, conta com apenas 1 música nova (homônima do disco), já que as outras duas já tinham sido lançadas em Reaching Horizons, primeiro EP da banda.

O EP se inicia com a própria Freedom Call, que tem um ritmo que lembra o estilo de Holy Land. É sucedida por Queen of the Night, que tem uma introdução muito interessante com violino e guitarra e um ótimo solo dos nossos amados Kiko e Rafael.

Logo após temos Reaching Horizons, maravilhosa obra composta por Bittencourt, que conta com belíssimos (alô professora Rosa!) arranjos de violão por André Matos. A guitarra aparece como secundária aqui - raríssimo de se ver, hein?

Bem, as faixas seguintes nós já conhecemos. São Stand Away, em uma linda versão orquestrada (as guitarradas foram substituídas por uma orquestra, acreditem!), Deep Blue, em versão reduzida, e...

Hm? Ah, sim... Antes de Deep Blue tem Painkiller... Eu preferia pular esse. Painkiller é de composição da banda Judas Priest, e é puro Heavy Metal. Os arranjos de guitarra até que passam, mas a introdução de bateria é irritante e a vocalização é uma aberração. Horrível, horrível. Não ouçam a não ser que queiram perder tempo e ficar surdos.

Agora vem a parte boa! Três músicas gravadas em um show na França. Aliás, o público metaleiro francês parece gostar bastante de folk. A primeira, Angel's Cry, tem um arranjo um pouco diferente da original, mais leve. Só que eles misturaram elementos - pasmem! - de música latina (uma paraguaia) e portuguesa (foliculi foliculá, foliculi foliculá... lá lá lá, foliculi foliculá!)! São 8 minutos de muita diversão, em especial na parte em que eles fazem um false end e a plateia aplaude - hehe.

Na sequência, vem uma que eu achei bastante interessante. Vejam vocês, Angra é uma banda excepcional exatamente porquê não se prende a um único estilo. Eles adoram misturar metal, que é a base deles, com os mais diversos estilos musicais. Mas tem um único estilo que eles não podem mexer, por ser perfeito demais: a Bossa Nova! E não mexeram mesmo. A música seguinte, Chega de Saudade, de composição de Tom Jobim, não foi alterada em uma nota sequer. Só Luís Mariutti no baixo e André Matos no violão - cantando em português, é claro.

Lembram-se que eu falei da versão de Never Understand? Pois é, ela vem agora. Um pouco mais leve que a original, como Angel's Cry, dessa vez ela é introduzida, além do arranjo original, por uma das mais famosas músicas nordestinas: Asa Branca, do nosso grande mestre Gonzaguinha! E a plateia adorou. Mas é contagiante mesmo.

Conclusão: apesar de contar com apenas uma música nova e ser menor que os outros álbuns, Freedom Call vale muito a pena. Mostra a versatilidade desse ótimo grupo. E como diria Galvão Bueno: é do Brasil-sil-sil!

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Até a próxima com Fireworks!

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Angel's Cry (1993) e a errata de um presunçoso

Depois de milênios sem postar aqui, venho cá postar o resto da discografia da melhor banda dos 4 continentes (eu sei que são 5, mas... Europa... Inglaterra... Sabe como é, não dá pra competir): Angra!


Angel's Cry, primeiro álbum da banda

Lançado em 1993, Angel's Cry segue um padrão que se vê em todos os outros álbuns (com exceção de Temple of Shadows e Aurora Consurgens): possui 10 faixas, é iniciada por uma música instrumental que continua diretamente na segunda faixa e tem uma música homônima do disco. Comparado aos próximos trabalhos deles, Angel's Cry não é uma obra-prima, mas é realmente muito bom para um disco de estreia.

Antes de mais nada, gostaria de pedir de joelhos minhas humildes e mortais desculpas a Kiko Loureiro. "Quem é esse?", você pergunta. Exatamente por isso peço desculpas. Loureiro é o parceiro de Rafael Bittencourt desde o início da banda até hoje, e é tão perfeito guitarrista quanto ele. Portanto, no meu post anterior, favor leiam "Bittencourt e Loureiro" onde eu disse apenas "Bittencourt".

Bom, falando do álbum; ele é iniciado por Unfinished Allegro, instrumental, que continua na faixa seguinte, Carry On. Esta, assim como grande parte das músicas do disco, é de um metal um pouco mais pesado do que se viu em Holy Land. Ou seja, somente Power Metal ao invés de Power-Progressive Metal. Mas já se vê que Loureiro e Bittencourt são mesmo músicos de qualidade.

Angel's Cry, homônima do disco, tem um ritmo bem bacana, marcado pela bateria de Alex Holzwarth. "Holz-o-quê? A banda não é brasileira?". Bom, sim. O baterista da banda, que aparece no encarte do CD e tudo o mais, é Ricardo Confessori. Mas na verdade, nesse álbum, quem assume a maior parte das gravações é esse alemão que mencionei. Depois de fazer esse ótimo trabalho com o Angra, ele foi integrar uma bandinha qualquer aí chamada "Rhapsody of Fire". É, rapaz, tá pensando o quê? O nível aqui é profissional!

Alguém aí já jogou Megaman? O X1/X2/X3? Pois é, quem já jogou vai se identificar muito não só com Stand Away, mas com o estilo geral do disco, pois é bem parecido. Vai ver que o Rafael e o Kiko eram músicos da Capcom antes de integrar a banda. Aliás, espere só pra ouvir Freedom Call. Tem uma versão orquestrada maravilhosa dessa música, onde as guitarradas são trocadas por música clássica. Linda, linda.

Ôxi, bixim, cê é nordestino? Então tu vai achar Never Understand a miór faixa desse disco, sem dúvida! Eu, pelo menos, acho. Nortistas e nordestinos são praticamente irmãos, e eu amo a música e a comida dos nossos amigos do sertão. Essa faixa é introduzida por um trechinho bem nordestino, visse? Com violão, mas depois com guitarra, bem ao estilo Angra. Ouve aí e me diz se o solo [que é feito aqui por Dirk Schlächter, Kai Hansen (considerado o fundador do Power Metal) e Sascha Paeth (que depois vai ser produtor de Holy Land!), sendo que este último é quem faz os trechos nordestinos no violão] aos 4:00 não é puro Megaman?! Depois ela fica mais agitadinha e tem uns vocais bem arretados. É paid'égua! Epa, isso é paraense...

A faixa 7, Wuthering Heights, é bastante bonita. Mas ao ouvi-la vocês se perguntarão: "Isso é Angra?". Bom, na verdade, não. Essa música é de uma cantora dos anos 70 chamada Kate Bush. Vi um dia desses o clipe dela na MTV, e posso afirmar que a vocalização do André combina com a original. Bittencourt e Loureiro fazem um trabalho genial aqui, assim como Thomas Nack, baterista convidado para essa música.

Streets of Tomorrow, Evil Warning e Lasting Child fecham o disco, com ótimos trabalhos de todos os membros da banda.
A segunda com ótimos trabalhos de guitarra+bateria e a última com um lindo trabalho nos teclados, violão e vocais de André Matos, que é também seu compositor. Um indício da influência clássica que a banda sofreria nos próximos álbuns, como Holy Land e Rebirth.

Bom, já mencionei o nome de todos, então aqui vai a escalação completa da banda até 1998:

André Matos - Vocais, teclados, violão
Kiko Loureiro - Guitarra
Rafael Bittencourt - Guitarra
Luís Mariutti - Baixo
Ricardo Confessori - Bateria

Links para download: Rapidshare

Bom, sobre a "errata de um presunçoso"... Lembram-se que no post de Holy Land eu disse que André Matos tinha errado na pronúncia da palavra "pushing"? Bom, segundo minha professora de inglês, ele pronunciou corretamente. "Não existe e nunca existiu 'pâshing'", disse ela. Puxa, e eu que aprendi e ouvi a vida toda errado...

Até a próxima com Freedom Call!

sexta-feira, 12 de junho de 2009

A insegurança nas ruas e o Dia dos Namorados

Outro dia desci do ônibus e fui andando em direção à minha casa, passando pelos 3 quarteirões a que estou habituado (faço isso todos os dias). Em uma parada [de ônibus] que fica pelo caminho, cruzei meu olhar com o de um homem, idade entre 30 e 35 anos, que (supostamente) esperava seu transporte naquele momento. Mas o olhar dele não foi um qualquer; era estranho, incisivo, e um tanto quanto espantado. Prossegui meu caminho e percebi, ao olhar algumas vezes para trás, que ele continuava com o olhar fixo em mim. Assim mesmo, sem disfarçar nem nada. Fixo. Vazio. Apressei-me em dobrar a esquina e olhar sorrateiramente para ver se ele me seguia. Não estava mais na parada, o que me fez acreditar que sim. Mil coisas passaram por minha cabeça na hora; entrar no primeiro táxi que aparecesse, sair correndo na direção que não era a da minha casa (já que eu moro num bairro não muito seguro, e ele poderia ter contatos por lá ou me marcar), procurar por um guarda. Mas nada disso me parecia plausível, e resolvi continuar no meu caminho. Olhei mais algumas vezes para trás, em pontos estratégicos da rota, para todas as direções, e nada. Nem sinal do homem. Aliviei-me e rumei para casa.

Apesar do alívio, minha preocupação não passou. Me fez pensar não só não no quanto estamos inseguros, mas no quanto nos sentimos inseguros. Se achamos que não há lugar seguro fora de casa, cada vez mais tenderemos a sair menos, a nos comunicarmos menos e a ter mais preconceito com pessoas que "pareçam" suspeitas. Outro dia fizemos uma redação que era justamente sobre violência urbana, e uma das coisas que eu destaquei foi a inversão de papéis na sociedade brasileira: nós, os chamados "cidadãos de bem", nos escondemos atrás de grades e câmeras, enquanto os criminosos correm soltos pelas ruas. Eu mesmo já fui assaltado na porta de casa. E muito pior do que a sensação real de ser assaltado é essa pressão, esse medo constante, essa sensação de insegurança. Afinal, todos sabem, o terror psicológico é muito pior do que o terror físico.

Mas falando de coisas boas agora (devem ter achado o título bem divergente, não?), gostaria de desejar a todos os casais um feliz Dia dos Namorados! Um dia atrasado, eu sei, mas o que vale é a intenção, não é mesmo? E àqueles que não têm alguém com quem compartilhar esse dia, eu só tenho uma mensagem: espero que seja por opção, que estejam felizes do jeito que estão! Eu sigo a teoria do mestre Jobim, mas quem sabe alguém consiga viver diferentemente!

E àqueles que dizem que "estão muito atarefados e não têm tempo pra isso": eu espero que percebam logo que "isso" não é um empecilho ou tarefa a ser cumprida mecanicamente, e sim uma forma de compartilhar momentos, sejam eles alegres, ruins ou até mesmo de muito trabalho.

Um abraço e até mais!

domingo, 31 de maio de 2009

Angra, Holy Land e o folk-progressive-metal

A música amazonense de Nilson Chaves. O metal progressivo característico da banda. Uma pitada da música clássica de Bach. Esses eram os ingredientes para se fazer um álbum perfeito. Mas André Matos acidentalmente acrescentou um elemento extra na mistura: a vocalização do J-Rock. E assim nasceu Holy Land, segundo álbum da banda brasileira Angra, lançado em 1996 na Alemanha.


Capa frontal do CD, que ao abrir-se revela um mapa do século XVI

A banda, que só canta em inglês, foi formada em 1991 em São Paulo, e segue a linha do metal progressivo, um estilo menos pesado de metal, que combina toda aquela parafernália do rock (guitarra, baixo, bateria) com instrumento mais suaves, pendentes para o clássico, como os de sopro. Holy Land é um álbum conceitual que conta a história do Brasil desde o seu descobrimento, descrevendo por entre suas canções, ora agitadas, ora calmas, a vida no país naqueles séculos. Todas são tão incrivelmente fantásticas que é impossível definir a melhor, e me senti na obrigação de analisá-las uma por uma.

1 - Crossing
Essa na verdade é uma missa de Giovanni Pierluigi da Palestrina, um importante compositor italiano da época da renascença, e representa a 1ª missa realizada em solo brasileiro.

2 - Nothing to Say
Continuação direta da 1ª faixa, nesta música já se percebe a influência de música clássica da banda, com a presença de violinos, além das guitarradas geniais de Rafael Bittencourt. O metal progressivo é marcado pelo ritmo, ditado pelo combo guitarra + baixo + bateria, que ora cresce e ora diminui.

3- Silence and Distance
Com uma suave introdução de piano e flauta que subitamente muda para guitarra e bateria, esta música conta com a vocalização bem característica do metal - aquela que deixa o cantor implorando por um expectorante. Novamente Rafael Bittencourt deixa sua marca, brindando-nos com sua guitarra. Após isso tudo, a música volta novamente para o piano, encerrando-se num tom melancólico.

4 - Carolina IV
Sem dúvida uma das melhores faixas do disco, Carolina IV combina tudo o que a banda misturou pra fazer esse álbum maravilhoso: guitarra, baixo, bateria, flauta e vocalizações auxiliares (em português!). Com grande influência de música brasileira, a música conta inclusive com um trecho puro de música amazonense, acompanhada por um tímido metal, que sabe que não pode competir, mas que logo depois entra em sua melhor forma, incluindo até mesmo piano em sua composição. Nota também para o trabalho do baixista, (músico mais injustiçado de uma banda, por estar sempre no fundo da guitarra e não ser percebido) Luís Mariutti.

5 - Holy Land
A música homônima do álbum é sem dúvida uma obra-prima de André Matos, seu compositor. Combinando piano, guitarra e baixo a flauta, chocalhos e tudo a que os músicos descendentes de índios têm direito, Holy Land nos embala num divertido ritmo folclórico, para então nos jogar nos braços de Bittencourt, de volta à pacata Amazônia, Bittencourt novamente e Amazônia + Bittencourt! Não é maconha, mas é uma viagem.

6 - The Shaman
Com a aura mais negativa do disco, essa música é linda em sua composição maléfica e progressiva, e abre espaço até mesmo para o depoimento de um pajé, falando, como o título sugere, dos rituais "xamânicos" (o termo correto seria "pajelança") praticados por índios brasileiros antes da chegada dos portugueses. Sinistramente linda. Ou lindamente sinistra.

7 - Make Believe
Indiscutivelmente digna de destaque, Make Believe tem a introdução mais linda e envolvente do disco. Com influências da MPB (marcadas pelo uso de outro instrumento de corda que não a guitarra e o baixo), André Matos fez um ótimo trabalho como vocalista aqui. Bittencourt, sem comentários.

8 - Z.I.T.O
Introdução com tambores inusitada; nosso mestre Rafael faz incrível aparição aqui também. A letra, que fala da vida humana in natura ("Mother nature brings to me, in fantastic purity, everything I need"), somada à melodia animada até nos faz perdoar a errata de pronúncia de Matos logo no início da música ("there's something shing back", ao invés de shing back). Pequena referência ao primeiro álbum da banda, Angel's Cry (sobre a qual meu próximo post será), pode ser ouvida aqui. A propósito, guitarradas de Bittencourt >>>² Chimbinha. Mas isso você já sabia.

9 - Deep Blue
A música que dá nome ao blog é a mais marcada pelo classicismo do disco. Órgão e corais de igreja podem ser ouvidos aqui. A própria letra da música (clique aqui) já fala dessa ligação da banda com a renascença europeia. Linda de verdade. Rafael faz uma pequena porém belíssima ponta aqui, para sumir de vez na 10ª (e última) faixa.

10 - Lullaby for Lucifer
Aqueles menos afeiçoados do metal devem ter lido esse título e pensado: "Puta merda, lá vem barulheira". Mas não. Apesar do nome, Lullaby for Lucifer é a música mais serena do disco. Só a título de encerramento mesmo, feita com violão, sons de ambiente e aura melancólica. Uma curiosidade é a pronúncia da palavra "apples" (épples ao invés de êipples), feita por André Matos, que denota seu aprendizado britânico, e não estadounidense, da língua.


Banda de metal, cabelo comprido não podia ser deixado de lado, né, gente?

A conclusão é: o álbum é simplesmente lindo. Vale a pena ser ouvido na íntegra!

Link para download:
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Até a próxima com Angel's Cry!

sexta-feira, 29 de maio de 2009

D-Cup e os piores títulos da história

D-Cup é o nome deste conto a seguir, que escrevi em uma tarde qualquer após inspirar-me sutilmente por algumas histórias de Holmes. Como sempre, minha falta de criatividade para títulos levou-me a esse, meio estranho, mas que tem a ver com a história. Para que possam entendê-la melhor, adicionei algumas notas de rodapé em lugares específicos do texto. Elas se encontram no fim, graças à formatação do blog. Não deixem de lê-las!


D-Cup


"- Era uma garota jovem, alegre, sociável e de um círculo de amizades invejável. Loira, magra, estatura mediana. Linda, linda. Não namorava, mas tinha em vista um rapaz do qual muito falava, que estuda em sua classe. Moramos aqui não faz um ano, e ela não costuma sair de casa sozinha. Vai à escola e volta; vez em quando sai com as amigas e nada mais. Temo que tenha se perdido, ou pior... - o homem perdeu o controle e pôs-se a chorar.
- Acalme-se, Sr. Hiedler. Tenho certeza de que encontraremos sua filha, mais cedo ou mais tarde. Mas para isso preciso que me explane os momentos anteriores ao seu sumiço."

Meu nome é Alfred Polanski. Moro em um pequeno apartamento da rua Mable, em Berlim. Durante muito tempo servi à OSS (hoje CIA), como membro da Divisão de Espionagem Internacional. Para alguns é difícil entender como um jovem de 19 anos conseguiu entrar em uma agência tão importante, mas depois de minha breve explicação, tudo se torna mais claro: fui um dos mentores da equipe que previu o ataque a Pearl Harbor, no Hawaii, em 7 de dezembro de 1941[1]. Meu chefe de seção aceitou-me porque julgava ter eu um incrível senso de percepção e análise – que se provou mais tarde verdadeiro.
Hoje estou aposentado, mas a imagem que construí durante a 2ª G.M. me faz ter que lidar com alguns casos de pessoas em desespero, como o do senhor que atendo agora. É no mínimo irônico que eu, tendo trabalhado contra mentes tão maléficas e ardilosas como as de Hitler, Goebbels[2] e Himmler[3] tenha vindo morar justamente na cidade que era seu covil. Mas não posso evitar. Ela me atrai inconscientemente, me fascina pela riqueza histórica que oculta e pela cultura do inconformismo criada entre seus habitantes. Mas mais irônico ainda é o fato do sobrenome deste senhor que aqui se encontra ser o mesmo da família do ditador nazista, e que só não passou ao seu pai por um descuido do escrivão que o registrou.

- Certo, Sr. Polanski, contar-lhe-ei tudo tal qual o sei. Espero que me perdoe, pois não sou muito detalhista e temo não poder responder-lhe tudo o que me perguntar.

- Não faz mal. Conte-me o que sabe.

- Bem, minha filha Anne desapareceu há cerca de seis dias atrás, na quarta-feira. Nesse dia ela foi à escola normalmente. Não tomou café, pois acordou tarde. Pegou suas coisas, beijou Klara e eu e saiu.

- Ah, sua esposa chama-se Klara? - interrompi eu.

- Sim, chama-se sim. Por quê?

- Nada, nada – respondi eu, pensando na incrível capacidade irônica do destino[4] – Prossiga com a narrativa, por favor.

- Bem, às 13:00 minha esposa e eu começamos a ficar preocupados, pois ela deveria estar em casa há uma hora atrás, e ela não era de se atrasar para o almoço. Saí à sua procura, e na escola me informaram que ela havia saído no horário normal, às 11:30. Passei em frente a uma lanchonete, onde julguei que ela pudesse ter parado em virtude da fome que possuía, mas nada encontrei. Foi então que, ao resolver voltar para casa e chamar a polícia, encontrei jogado na calçada um bloquinho de anotações que pertence a Anne. Foi tudo o que consegui entregar às autoridades como prova, e tudo o que lhe trago agora para que possa tentar deduzir algo sobre esse caso.

- Então a polícia devolveu o bloquinho?

- Sim, veja o Sr. Eles estão tão convencidos de que ela foi raptada e depois assassinada pelo jovem Hain que lhe prenderam e deram o caso como resolvido. O julgamento dele é na próxima sexta.

- E esse quem é? E como os inspetores chegaram a essa conclusão?
- Lembra-se de que falei do rapaz que minha filha gosta? Pois bem; há em sua sala outro rapaz, este Hain, que segundo os depoimentos de algumas amigas de minha filha há muito é apaixonado por ela. É muito inteligente, recatado, mas muito fechado, de modo que poucos o conhecem bem. No bloco que encontrei havia desenhos do garoto por quem ela se enamora, e no canto da última folha havia uma pequena declaração e uma premeditação de tragédia (que poderia muito bem ser um suicídio, mas que os inspetores interpretaram como assassinato), que os peritos comprovaram como sendo de Hain. Prenderam-lhe imediatamente, como já lhe contei, de modo que ele agora espera julgamento.

- Posso ver o caderno que encontrou?

- Sim, aqui está - respondeu ele, entregando-me.

Passei a analisá-lo. Era um bloco de anotações comum, desses que se compra em qualquer papelaria, mas muito bem cuidado – tirando as páginas sujas de terra por causa da queda ao chão. Era cheio de desenhos, conversas entre amigas e pequenos adesivos. Após uma breve inspeção, devolvi-o ao Sr. Hiedler.
- Bem, Sr. Hiedler, vejo que sua filha é uma exímia desenhista. Não suporta álgebra, é perfeccionista e tem amigas que adoram sair à noite.
Ele me olhou espantado, balbuciando palavras como “de”, “que”, “modo” e “senhor”. Sorri.

- Veja bem, senhor, não é difícil reconhecer alguém que não gosta de matemática, ainda mais com tantas equações e fórmulas erradas em seu caderno. No entanto, o modo como as organiza, como escreve e como conserva o caderno denota seu perfeccionismo. Quanto às amigas, nada de extraordinário; nas páginas em que há diálogos entre elas e sua filha percebi um cheiro quase esgotado pelo tempo em que ficou sem uso. Um cheiro de perfume muito forte, que só poderia ser usado à noite, e que mesmo após o banho da manhã ainda impregna o corpo. E como presumo que o senhor e sua esposa não a deixam sair à noite, concluo que ele pertence a uma de suas amigas. Não que isso seja relevante às investigações. - brinquei.

- Sim, o Sr. está certo. Mas e quanto ao desaparecimento dela?

- Creio já ter descoberto algo que pode ajudar. Por favor, deixe seu telefone comigo que entrarei em contato quando tiver mais informações. Ah, e por favor, deixe o caderno também, ainda usarei-o para mais uma coisa.

O homem agradeceu e saiu, deixando-me a só com o bloco.

O que ninguém percebeu foi que as manchas de sujeira das páginas que entraram em contato com a calçada faziam um pequeno trajeto, de baixo para cima, o que significa que ele foi colhido depois de caído. Uma folha estava arrancada, mas uma parte permanecia no caderno, denotando que quem o fez estava com pressa ou não ligava a mínima para o fato de o caderno ter uma assimetria, o que não batia com o perfil de Anne. Suspeitei e, analisando melhor a folha seguinte a esta, descobri que ela continha os sulcos de um desenho! Consegui, com a ajuda de um lápis de cera, destacá-lo; era o retrato de um homem, barbudo, de feições grosseiras, que em nada se parecia com qualquer um dos amigos que Anne havia desenhado em outras folhas. "Mas então", pensei, "este desenho foi feito na página arrancada. Está tremido, um tanto mal-feito se comparado aos outros que ela fez. Significa, então, que ao fazê-lo ela estava nervosa. Mas por quê?" Peguei o desenho que destacara e fui até a polícia. Mostrei o retrato ao delegado, que prontamente identificou-o como sendo o de Nikolai Sarcovich.

- O famoso estelionatário russo? - espantei-me.

- Sim, ele mesmo. Há alguns meses estamos em seu encalço. Parece que ele está aqui, em Berlim, e já é suspeito de um sequestro.

Estremeci.

- Alguma pista do caso a que se refere? - perguntei.

- Sim. Meus homens encontraram um esconderijo na rua Syrup, nº 221, que acreditam ter pertencido a ele. Provavelmente manteve lá a jovem Lina Hanz, e agora, julgando não estar mais seguro, mudou-se para outro local.

- Muito obrigado, delegado, o Sr. foi de grande ajuda para minhas investigações. Agora já vou indo.

- Perdoe-me ser indiscreto, Sr. Polanski, mas em que caso trabalha no momento?

- No desaparecimento de Anne Hiedler, Sr.

- Ora, de Anne? - riu-se ele, esticando os pés sobre a mesa - Ele já está solucionado. Foi aquele esquisito do Hain. É só uma questão de tempo até que meus interrogadores o façam dizer onde ela está.

- Não tenha tanta certeza assim, Sr. Edartsel - respondi, secamente - Nem sempre o culpado é o mordomo. Estou indo até a rua Syrup agora, e espero que seus homens não me impeçam de entrar na casa.

- Quem sou eu para impedir o grande Alfred Polanski de investigar? Avisarei a eles - disse, com um odioso tom sarcástico.

- Obrigado, e até mais.

Fechei a porta atrás de mim e me dirigi à rua Syrup.

Chegando lá, encontrei a casa tal qual foi deixada: toda revirada, suja e bagunçada. "Malditos investigadores, não são nada sutis", pensei. Após uma inspeção na casa, algumas coisas me chamaram a atenção. Liguei imediatamente para o Sr. Hiedler.

- Aqui é Otto Hiedler. Com quem falo?

- Boa tarde, Sr. Hiedler. Aqui é Alfred Polanski.

- Sr. Polanski! - exclamou meu cliente - Alguma notícia nova, Sr?

- Creio que sim, mas não tenho certeza. Liguei para lhe fazer três perguntas que me ajudarão em minhas deduções.

- Ficarei feliz em respondê-las.

- Primeira: no dia em que sumiu, sua filha levava alguma roupa extra na mochila?

- Sim, pois era dia de educação física. Levou roupas íntimas, uma saia e uma blusa verdes, se não me engano.

- Perfeito! Segunda: sua filha tem algum tipo de alergia?

- Sim, a mofo e poeira. Sempre que entra em contato com eles tem uma crise alérgica e precisa tomar uma dose de Loratadina[5]; caso contrário, morreria sufocada.

- Já que é tão grave, deve carregar o remédio sempre com ela, presumo eu.

- Sim senhor.

- Ok, Sr. Hiedler, terceira e última pergunta. Espero que entenda que é de suma importância para minhas investigações, e que de modo algum se sinta ofendido.

- Sim?

- Qual o tamanho dos seios de sua filha?

- Como disse? - respondeu ele, surpreso.

- O Sr. ouviu, Sr. Hiedler, não me faça repetir; apenas classifique-os: escassos, medianos ou fartos?

- Bem... fartos. Mas não entendo como isso pode lhe ajudar a...

- Obrigado, Sr. Hiedler, foi de muita ajuda - interrompi. Agora preciso desligar. Não há tempo a perder! - e desliguei.

Saí às pressas e fui até Lebenrach-Strauss, a pequena e pacata vila campestre nos arredores da cidade. Fazendo-me passar por um vendedor de apólices de seguros, bati de casa em casa, procurando observar bem os ambientes de cada uma. Já passava das seis da tarde quando bati à porta de um senhor com as feições muito parecidas com as do desenho de Anne - sem dúvida era Nikolai! Disfarcei oferecendo-lhe uma apólice contra acidentes domésticos e casuais enquanto esquadrinhava a residência: era muito bem ajeitadinha e limpa, com quadros e objetos perfeitamente dispostos. Ao contrário do próprio Nikolai, que tinha uma aparência suja e fétida. Em cima da mesa havia uma sacola cujo rótulo logo reconheci: era da Liess, grande rede de farmácias alemã, e cuja filial não ficava há mais de uma quadra dali.

- Não quero comprar nada! - respondeu o canalha com rispidez.

- Mas senhor, esta aqui é ótima! - insisti, representando o papel do chato comerciante que personificava - Nunca se sabe quando terá acidentes assim. Podem acontecer a qualquer momento!

- Não! E não me perturbe mais! - e fechou a porta em minha cara.

Fui até a Liess e fingi procurar por um antialérgico. A atendente prontamente me recomendou o mesmo remédio que Anne tomava em caso de crise - ou pelo menos era similar.

- Este aqui é ótimo, senhor! Recomendado contra todo tipo de crise alérgica. Ação imediata!

- Ah, perfeito! Era esse mesmo que eu procurava. Tão bom assim deve vender bastante, não é mesmo? - intuí.

- Na verdade, senhor, este é apenas o segundo que vendemos esta semana. O Sr. sabe, Strauss é muito limpa e natural. As pessoas não costumam ter problemas respiratórios aqui. O que mais vendemos são analgésicos, antitérmicos e preservativos.

- Entendo perfeitamente. Mas então, a pessoa que comprou o remédio antes de mim deve ser nova na vila.

- Oh, sim, um senhor e sua filha que chegaram aqui na sexta-feira. Eles se instalaram em uma casa que estava para alugar. Vieram aqui no mesmo dia, comprar este remédio e alguns Band-aids. O curioso é que eles não parecem pai e filha... Ele é alto, truculento, de cabelos negros e feições brutas; ela é mais baixa, loira, de feições delicadas e...

- Seios fartos - completei, lembrando-me do que seu pai havia dito.

- Oh! O Sr. a conhece?

- De certa forma, sim.

- Então pode me fazer um favor? Leve a ela estes cinco marcos e diga que é o troco do que compraram. Ela se atrapalhou nas contas e me deu dinheiro a mais, veja o Sr.!

- Ah, sim, claro, pode deixar. Obrigado, e até mais.

Paguei o remédio e saí. Já sabia tudo que precisava saber. Agora só faltava contatar meu amistoso e queridíssimo Sr. Edartsel, da polícia de Berlim. Liguei também para o Sr. Hiedler, e disse-lhe que o caso estava resolvido - Otto soltou um urro de felicidade, e eu lhe disse que estivesse em Lebenrach-Strauss às 7 da manhã - e nem um minuto a menos.

Às 6 da manhã o delegado Edartsel estava comigo em frente à casa de Nikolai.

- E então? Já podemos pegá-lo? - perguntou ele a mim, ansioso.

- Isso depende. Seus homens já estão em posição?

- Sim, estão. As duas únicas saídas da vila estão bloqueadas por viaturas. Meus homens já cercam a casa.

- E meu revólver está pronto também - acrescentei. Então, ataquemos!

Edartsel fez um sinal para os homens em volta da casa e todos irrompemos praticamente ao mesmo tempo. Armas eram apontadas em todas as direções. Todos procuravam por Nikolai, mas só o que encontraram foi Lina Hanz, filha do magnata Bismarck Hanz, a quem o inescrupuloso sequestrara para obter milhões de resgate. Estava amarrada e cheia de hematomas, mas viva - e isso é o que importava.

- Sarcovich não está aqui, senhor! - gritou um dos policiais - Já procuramos em todo lugar!

- Ligue para os postos norte e sul! Um deles deve tê-lo pego.

- Não se importe com isso. É inútil. Nikolai não está mais aqui- disse eu, abatido.

- Como pode ter tanta certeza, Sr. Sherlock?

- Não é preciso ter a mente de Holmes para saber disso - entreguei-lhe um bilhete que encontrara em cima da mesa - Leia.

Dizia:

"Meu caro amigo Polanski,

Impressiono-me com suas habilidades de investigação, mas presumo que já as conhecia. O Sr. é bastante famoso, sabia? Realmente achou que aquele disfarce de vendedor de seguros me enganaria? Francamente!

Mas bem, o Sr. conseguiu o que queria: frustrar meus planos. Desde que apareceu aqui sabia que me vigiaria, e que traria o estúpido Sr. Edartsel e sua tropa de palhaços para me pegar. Era inviável levar essas duas mimadas junto comigo, de modo que tive de fugir sozinho e deixá-las aqui. Poderia tê-las matado, é verdade, mas não faz o meu estilo; sou um homem de negócios. Espero que não se desaponte por seu 6 de julho[6] não ter dado certo, mas é a um brilhante e astuto russo chamado Sarcovich que o Sr. enfrenta - e não um alemãozinho patife chamado Rommel[7].

Espero nos encontrarmos de novo para tratar de negócios mais interessantes que apólices de seguros.

Sinceramente seu,

Nikolai Sarcovich."

- Então ele sabia... - exclamou, desiludido, o delegado.

- Sim, e a essa hora já deve estar bem longe daqui. Raios! Se eu fosse um pouco mais jovem poderia tê-lo pego eu mesmo! Mas tudo bem; o importante é que as reféns estão a salvo.

- Espere! - disse ele - Que duas reféns? Aqui só tem a Srta. Lina!

- Veja, Edartsel - apontei para a cama onde a jovem estava - Essa cama possui um segundo andar abaixo dela. Puxe-o.

- Mas é Anne Hiedler! - a moça estava amarrada e amordaçada - Mas como?! Foi o tal de Hain quem...

Edartsel foi interrompido pelos gritos de Otto e Klara Hiedler, que acabavam de chegar.

- Anne! Minha filha, você está bem! - os três se abraçaram - Tememos o pior!

- Eu estou bem, papai! - respondeu a linda jovem ariana - Tudo graças a esses senhores!

Neste momento, todos olharam para mim. A família Hiedler, irradiante; Edartsel, estupefato.

- Mas como? - perguntaram eles - Como o senhor descobriu isso tudo?!

- Bem - comecei minha narrativa - todas as minhas deduções são muito claras, e tenho certeza de que qualquer um de vocês, em semelhante situação, poderia tê-las feito.

Depois que Edartsel me disse que o esconderijo temporário de Nikolai ficava na rua Syrup, fui até lá para investigar. O lugar era úmido, sujo, bagunçado, muito propício a todo tipo de fungo. Encontrei um antialérgico que não poderia ser de Sarcovich, já que, se ele tivesse esse problema, jamais escolheria um local assim em primeiro lugar. Deveria pertencer, então, a outra pessoa. Além disso, encontrei roupas de mulher - que, a menos que fossem um péssimo disfarce do bandido, poderiam estar relacionadas à pessoa que deixou o remédio lá. Por isso liguei para o senhor, Sr. Hiedler, e lhe perguntei sobre as roupas extras e a alergia.

- Compreendo agora - disse ele - Mas isso não explica o fato de ter me perguntado sobre os seios de minha filha, Sr. Polanski - enfatizou o "Sr. Polanski", num tom um tanto quanto indignado.

- Veja bem, Sr. Hiedler, eu pedi que não me interpretasse mal, e no entanto o Sr. o fez. Se perguntei sobre algo tão indelicado é porque era pertinente à investigação. Junto com as roupas que encontrei havia um sutiã de tamanho avantajado, que de modo algum poderia pertencer à Srta. Hanz, uma vez que ela é jovem demais para ter as mamas tão bem desenvolvidas.

Anne cruzou os braços, enrubescida.

- Entendo, Sr. Polanski, e peço-lhe perdão por duvidar de sua integridade. Por favor prossiga com a narrativa.

- Pois bem - continuei -, aquele local era perigoso demais para alguém que tinha problemas alérgicos, de modo que era preciso um local mais calmo, limpo e tranquilo - e a melhor opção era aqui, em Strauss. Claro que Nikolai também já sabia que a polícia estava em seu encalço, e precisava mudar de esconderijo.

Edartsel entortou a boca

- Mas ainda me faltava saber: estaria realmente Anne com Sarcovich? Rumei para cá e, disfarçado de vendedor de seguros, passei a investigar todas as casas até chegar a dele. Reconheci-o, e erroneamente achei que a recíproca não era verdadeira, o que lhe deu sobressalto e tempo de fugir.

- E o que lhe fez ter certeza de que eu estava aqui? - perguntou a linda moça.

- Ora, porque você mesma não me diz? Conte-nos: qual era o aspecto físico mais marcante do Sr. Nikolai?

- Bem, ele parecia um francês; jamais tomava banho. No máximo trocava de roupa, mas isso não anulava o fedor.

- Perfeito. Vejam, senhores, que este Sr. Sarcovich não era muito dado a limpeza. Como me explicariam, então, a impecabilidade desta casa?

- Ele poderia ter contratado uma diarista - respondeu Edartsel, com um olhar desafiador.

- Ora, meu caro amigo, você e suas obviedades - disse eu, pondo a mão em seu ombro só para irritá-lo. Você conhece tão bem quanto eu os péssimos serviços domésticos que nos prestam essas moças hoje em dia. Diarista alguma teria se dado ao trabalho de organizar esta estante por cor de capa e muito menos de deixar simétricos esses quadros na parede. Só poderia ser obra de nossa bela Anne aqui. Não é verdade, Srta.?

- Sim - respondeu ela -, eu não aguentei ver a casa como estava e tive que arrumá-la.

- Por fim, notei que havia um pacote da Liess em cima da mesa quando olhei para a casa. Fui até a farmácia e obtive preciosas informações de que um senhor moreno e sua filha loira tinham ido até lá para comprar um antialérgico e alguns Band-aids. A propósito, Srta., aqui estão os cinco marcos que a caixa ficou lhe devendo em virtude de seus cálculos errados.

- Sempre odiei matemática - murmurou ela, enquanto pegava o dinheiro.

- Espere! O Sr. disse Band-aids? Oh, meu Deus, minha filha, ele te machucou!? - perguntou a Sra. Hiedler, preocupada.

- Não, não, mamãe, os curativos eram para...

- O rosto do Sr. Sarcovich - completei eu.

- Exato, mas... Como o senhor sabe? Ele os tirou no domingo! - exclamou a menina.

- Elementar, minha cara Anne. No banheiro da casa em Syrup havia um barbeador de péssima qualidade, com a lâmina cega e suja de sangue. Pouco demais para que não pertencesse ao rosto de quem o usou. E, como o Sr. Sarcovich possuía o rosto barbeado quando o vi ontem, presumo que ele o usou, mas acabou se cortando.

- Brilhante! - exclamou a Sra. Hiedler.

- Bem, Anne, acredito que as coisas na quarta-feira tenham acontecido do seguinte modo. Se eu errar ou me escapar algo, por favor, me avise.

- Está bem - respondeu ela.

- Você saiu da escola às 11:30, como de costume. Veio andando para casa pela rua Syrup, e apesar da fome que possuía, resolveu que seria melhor almoçar em casa do que ficar gastando dinheiro na rua.

- Certo.

- Você prosseguiu e passou em frente ao nº 221, onde escutou alguém chorar, e olhando por uma fresta viu o Sr. Sarcovich agredir a pobre Lina para que pudesse tirar uma foto que comovesse seus pais. Você pensou em sair correndo e avisar um policial, mas achou que estes ocupados e insensíveis guardas berlinenses não lhe dariam a menor atenção, e resolveu fazer um retrato dele para ter algo a apresentar às autoridades. Nervosa e com pressa, você foi surpreendida por Nikolai, e com o susto deixou o bloco cair ao chão, enquanto que o lápis voou longe. Ele o recolheu, arrancou enfurecido o pedaço de papel que correspondia ao seu retrato e arrastou-a para dentro da casa, fazendo-a de refém para que não contasse a ninguém sobre o que vira.

A jovem ouvia atentamente a minha história. Ao final, exclamou, surpresa:

- É incrível, Sr. Polanski, foi exatamente como tudo aconteceu. Parece até que o senhor estava lá! Mas não, não foi para mostrar às autoridades que fiz o desenho. Na verdade, não sei porquê o fiz. A reação óbvia de qualquer pessoa seria sair correndo e chamar um policial, mas eu não; fiquei ali, parada, tentando desenhá-lo.

- Eu não trabalho com o óbvio e tampouco com as emoções, Srta. Tudo o que faço é baseado na mais pura racionalidade. Daí eu ter errado esse pequeno detalhe.

- Bem, o importante é que o senhor resolveu o caso, Sr. Polanski, e aqui está sua gratificação. Creio eu que já podemos ir para casa agora - disse o Sr. Hiedler, entregando-me um cheque.

- Sim, certamente. Acho que passarei uma temporada em Novogrudek[8], minha terra natal. O ar de lá me faz bem.

- Muito obrigada, Sr. Polanski! - disse Anne, abraçando-me e contraindo seu volumoso busto contra meu peito - Devo minha vida ao senhor!

- Não há de ser nada, minha querida. Aliás, posso dar-lhe um conselho?

- Que pergunta! É claro que sim!

- Tome aulas de matemática com Hain Bielski, de sua classe na escola. Estou certo de que ele tem muito a ensiná-la.

Ela agradeceu e a família se foi. Edartsel se aproximou de mim.

- Bielski? - ele arregalou os olhos, estupefato - Mas não é aquela família que...[9]

- Investigue melhor antes de acusar um conterrâneo meu, Sr. Edartsel. Aliás, solte-o imediatamente, antes que seus gentis interrogadores o machuquem. E acho que o Sr. lhe deve desculpas pessoalmente.



[1] O ataque a Pearl Harbor foi previsto horas antes de acontecer graças aos esforços da inteligência estadounidense. No entanto, problemas de comunicação impediram que a mensagem chegasse a tempo ao porto, deixando de, assim, evitar o ataque.

[2] Joseph Goebbels, ministro da propaganda alemã durante a 2ª Guerra, foi responsável por grande parte da lavagem cerebral feita na população.

[3] Heinrich Himmler, chefe da Gestapo e da SS (respectivamente polícia secreta e tropa de choque alemã) durante a 2ª Guerra, perseguiu, prendeu e assassinou diversos dissidentes políticos durante sua gestão.

[4] O nome da mãe de Adolf Hitler era Klara Hitler.

[5] Substância ativa de diversos medicamentos antialérgicos.

[6] 6 de julho, mais conhecido como "Dia D", foi o dia escolhido para o ataque pelas tropas aliadas às tropas alemãs, que ocupavam a França durante a 2ª Guerra Mundial. O elemento surpresa foi essencial para o sucesso da missão.

[7] Erwin Rommel, o "Raposa do Deserto", foi um general alemão cuja atuação no Afrikakorps (campanhas alemãs pela África) lhe rendeu muitos louros. Era responsável pela defesa da área litorânea francesa atacada pelos aliados no Dia D. Coincidentemente (ou não), neste dia estava em Berlim, comemorando o aniversário de sua mulher.

[8] Importante cidade da Polônia, onde nasceram os irmãos Bielski (ver a seguir).

[9] O livro "Os Irmãos Bielski", de Peter Duffy, conta a história real de 3 judeus poloneses que, reunindo pessoas e libertando prisioneiros de campos de concentração, constituíram um refúgio na floresta, onde sobreviveram aos ataques nazistas até o fim da guerra.

O porquê de um blog e o desamparo social

Bom, este é o início deste blog, que não sei exatamente porquê resolvi começar. Ter um espaço para comentar situações do dia-a-dia, indicar bandas e postar contos é realmente legal, mas não pode ser só isso. Deve haver algum motivo a mais. Mas quem sou eu para me julgar? "É bem mais difícil julgar a si mesmo que julgar os outros", já dizia o rei de um dos planetinhas que o Pequeno Príncipe visitou.

Bom, a ambiguidade do título do blog dá-se pela minha incrível falta de criatividade para criá-los (os títulos). "Deep Blue" é o nome de uma música da banda brasileira Angra (e que sobre a qual farei um post mais tarde), mas também é, segundo uma rápida pesquisa minha, o nome de um "supercomputador criado pela IBM especialmente para jogar xadrez, com 256 co-processadores , capazes de analisar aproximadamente 200 milhões de posições por segundo". Curioso...

Um dos pontapés para a criação desse blog foi uma situação que aconteceu comigo hoje. Voltava para casa quando sobe no ônibus um senhor já de idade, muito magro e cambaleante. Apresentou-se com um nome que não me recordo, mas que é algo próximo de "Alcílio". Disse que foi professor da UFPa, que estava acometido de uma leucemia e precisava tratar-se. Disse ainda que tinha sido assaltado e perdeu tudo, e andava de transporte em transporte pedindo algum dinheiro para ajudar-lhe em tal sentido. Desci, pois era realmente minha parada, mas junto comigo desceram várias pessoas que estou certo de que não iam fazê-lo. A simples presença daquele senhor as incomodava, e achei aquilo muito triste. Vim andando pela rua das Mercedes (aquela ali perto de São Braz que fica entre a 25 de março e a José Bonifácio, bem próximo do Formosa) e lá vi também diversos moradores de rua, deitados, uns dormindo, outros fitando o horizonte. Perdidos, distraídos. E isso me fez pensar em quanto reclamamos de nossa boa vida. Pelo menos quanto a mim, tirando minha vida sentimental, ela é perfeita. E mesmo assim não sou plenamente feliz.

Pra um post de estreia (sem acento) é só. Fico por aqui.

P.S: Falando em língua portuguesa, quantas ênclises, não? É que elas são mais legais.